Escola Estadual Fausto Cardoso
Disciplina Educação Física
Professora Grasiela Silva
TEXTO (06/10/2020)
Disponível em: https://brasil.elpais.com/brasil/2017/12/28/deportes/1514427700_914142.html
A violência no futebol como um retrato do Brasil
Com ingressos caros e cerco a movimentos populares de torcidas, estádios como o Maracanã se tornam ambientes cada vez mais inseguros
Breiller Pires
Pisoteamento, arrastão, empurra-empurra, agressões, vandalismo e até mesmo furto a um torcedor que estava caído no asfalto após ter sido atropelado nas imediações do Maracanã. As cenas de selvageria protagonizadas no último dia 13 de dezembro, quando o Flamengo recebeu o Independiente pela final da Copa Sul-Americana, tiveram como estopim uma invasão de milhares de torcedores sem ingresso, que furaram o bloqueio policial e transformaram o maior estádio do Brasil em terra de ninguém. Um reflexo não só do quadro de insegurança que assola o Estado do Rio de Janeiro, mas também de como a violência social se embrenha pelo esporte mais popular do país. Em 2017, foram registrados 104 episódios violentos relacionados ao futebol brasileiro, que resultaram em 11 mortes de torcedores – outros sete casos ainda estão sob investigação.
Os dados são fruto de um levantamento anual realizado pela Pesquisa de Mestrado da Universo, coordenada por Mauricio Murad, professor e doutor em sociologia do esporte, que estuda o comportamento de torcidas. “Os distúrbios mais recentes no Maracanã apenas confirmam a incapacidade das autoridades em lidar com a violência no futebol”, afirma o pesquisador. Após o incidente na final da Sul-Americana, o Flamengo foi denunciado pelo Tribunal de Disciplina da Conmebol e pode ser punido com multa, perda de mando de campo ou até exclusão de campeonatos.
A diretoria do clube responsabilizou a Polícia Militar do Rio de Janeiro, alegando que a corporação “tem encontrado muitas dificuldades do ponto de vista de estrutura e contingente para realizar seu trabalho nas praças esportivas e outros pontos do estado”. Ainda argumentou, em nota oficial, que havia solicitado antes da partida o máximo efetivo policial à PM, que, por sua vez, entendeu que a forma de concessão de ingressos a sócios adotada pelo Flamengo, por meio de apresentação do cartão de crédito nas catracas, impossibilitou o bloqueio das ruas no entorno do estádio. O Ministério Público do Estado solicitou a abertura de uma investigação para apurar falhas de segurança no evento.
(...)
Porém, de acordo com especialistas, a postura meramente repressiva contra torcidas organizadas se mostra ineficaz no contexto de uma sociedade que registra mais de 61.000 homicídios por ano e tem a terceira maior população carcerária do mundo.
“Existem a via da repressão e a via da prevenção”, afirma Bernardo Buarque de Hollanda, pesquisador e professor de ciências sociais da Fundação Getúlio Vargas. “O ideal seria dosar as duas coisas, mas, no Brasil, tem prevalecido a via da repressão, ao contrário de outros países que estão conseguindo bons resultados com trabalhos preventivos no futebol, como Alemanha e Colômbia. E a repressão indiscriminada, sem separar agressores de torcedores, acontece através de inúmeras tentativas de asfixiar as torcidas organizadas, qualificando seus membros como pessoas predispostas ao enfrentamento. Isso gera um efeito colateral, que é o aumento do nível de beligerância nos estádios, acirrando a tensão entre torcidas e a polícia.”
No Rio de Janeiro, apesar de contar com o Grupamento Especial de Policiamento em Estádios (Gepe), uma das poucas equipes de policiais treinados para trabalhar em eventos esportivos do país, confrontos com traços de barbárie entre torcidas e polícia são tão frequentes como em outros estados brasileiros. O de maior repercussão do ano, porém, aconteceu em São Paulo. Embate em que os papéis de vítima e agressor estavam bem definidos. Imagens de um policial golpeando e intimidando Gideão Messias da Silva, que estava acompanhado do filho de 9 anos no estádio Moisés Lucarelli, em Campinas, no momento em que a polícia tentava conter uma invasão de torcedores da Ponte Preta, geraram revolta nas redes sociais, mas não resultaram em punição ao agente violento. O 1º Batalhão de Ações Especiais de Polícia justificou a ação como “uma medida para garantir a segurança dos torcedores”.
Mauricio Murad, que é autor do livro A violência no futebol: novas pesquisas, novas ideias, novas propostas, classifica o episódio como mais uma mostra de como “o torcedor é maltratado e humilhado nos estádios brasileiros. Tumultos como o do Maracanã também expõem uma polícia desaparelhada e despreparada para resguardar os direitos de torcedores. É impossível dissociar a escalada de violência no futebol do panorama de desordem pública, social, econômica e política vivido pelo país, especialmente no Rio de Janeiro".
Em setembro, a Comissão de Constituição e Justiça do Senado aprovou uma proposta que prevê alterações no Estatuto do Torcedor, como penas mais rígidas para integrantes de torcidas envolvidos em conflitos e a restrição do repasse de recursos financeiros às organizadas. O projeto ainda será analisado em outras comissões antes de ir à votação, mas já despertou o repúdio da Associação Nacional de Torcidas Organizadas (Anatorg) e críticas até mesmo de juristas ligados ao Superior Tribunal de Justiça Desportiva (STJD), que não veem a criminalização indistinta de grupos de torcedores como solução para a violência no futebol. “Os clubes precisam participar ativamente do processo de formação e fomento de suas torcidas organizadas. Eles devem ser protagonistas no esforço de separar criminosos de torcedores, e não só as autoridades públicas”, diz Paulo Schimitt, ex-procurador-geral do STJD.
Para André Azevedo, presidente da Anatorg, propostas como a que tramita no Senado, em vez de recomendar punições individuais a infratores, generalizam movimentos de torcidas. “O Brasil é um país violento”, argumenta Azevedo. “Assim como em outras áreas, inclusive na política e na polícia, há pessoas agressivas e de má índole nas organizadas. Isso não significa que todos os torcedores sejam bandidos. (...)
Lideranças de torcidas organizadas defendem, além das penas individualizadas, maior controle das forças de segurança no acesso aos estádios para evitar confrontos, incluindo a identificação de torcedores por biometria que começou a ser implementada em estádios como a Arena da Baixada, em Curitiba. Por outro lado, contestam a inflação no preço do ingresso cobrado pelos clubes em jogos nacionais. Na final da Sul-Americana, o Flamengo, que tem o tíquete médio mais caro do Brasil (61 reais por partida), cobrou de seus sócios entre 80 e 245 reais. Torcedores não associados tiveram de pagar entre 240 e 780 reais para assistir ao jogo com o Independiente.
“O encarecimento dos ingressos entra nesse pacote de violências contra o torcedor”, explica Murad. “Os preços exorbitantes praticados nos estádios brasileiros afastam as pessoas mais pobres do espetáculo. Muitos desses excluídos acabaram se tornando massa de manobra para os bandidos que orquestraram a invasão ao Maracanã. Uma coisa puxa a outra. Enquanto não atacarmos as causas do problema, investindo em políticas sociais, participação ativa dos clubes, inteligência e prevenção da violência, seguiremos com um sistema de repressão que mal consegue combater as consequências.”
QUESTÕES (13/10)
1. A identificação simbólica que existe na cultura esportiva pode ser um fator determinante nas ações potencialmente agressivas dos espectadores e torcedores de futebol. Essa identificação em indivíduos que não têm uma identidade própria pode levá-los a não perceber os limites entre a sua vida e a sua equipe, ou entre a sua vida e a vida de um ídolo (jogador), e, dessa forma, passar a viver suas emoções basicamente por meio de acontecimentos esportivos, do sucesso e da derrota de seu clube predileto. Alguns dos torcedores organizados dedicam a vida à sua torcida. Vivem para ela e, por ela, chegam a perder qualquer outra referência, pois é essa experiência compensatória que lhes dá identidade. A probabilidade de um indivíduo se tornar um torcedor fanático está diretamente relacionada com a construção da sua identidade. Por isso, é imprescindível o desenvolvimento de relações e valores próprios que o ajudarão a delinear o limite entre ele e a sua equipe, ou entre ele e um jogador de futebol. (REIS, H. H. B. Futebol e violência).
Partindo da discussão sobre as relações entre o torcedor e seu clube, observa-se que o fanatismo futebolístico
a) deriva da falta de referências para a construção de valores morais em crise na sociedade.
b) está relacionado à fragilidade identitária, o que dificulta a dissociação entre sua vida e a de seu clube ou ídolo.
c) perde sustentação naqueles torcedores organizados que não conseguem separar as esferas pública e privada.
d) decorre do estabelecimento de uma identidade própria do indivíduo, forjada pela tutela do clube e de seus ídolos.
e) é restrito às torcidas jovens, que corrompem a identidade individual de seus torcedores em favor da identidade coletiva.
2. Observe a charge abaixo.
Sobre a violência nos estádios, o autor da charge mostra a seguinte posição:
a) mostra a violência como natural nos estádios.
b) apoia a violência como parte do esporte.
c) condena a violência nos jogos.
d) demonstra compreensão pela violência.
e) sente pena da bola.
3. O Estatuto de Defesa do Torcedor (Lei/1° 10.671/03) define como crimes as condutas abaixo, exceto
a) invadir local restrito aos competidores em eventos esportivos.
b) fraudar, por qualquer meio, o resultado de competição esportiva.
c) prometer vantagem não patrimonial com o fim de alterar o resultado de competição desportiva
d) aceitar para si vantagem patrimonial com o fim de falsear o resultado de competição esportiva.
e) constranger, mediante violência ou grave ameaça, dirigente de entidade responsável pela organização da competição com o fim de falsear o resultado de evento esportivo.
4. A imagem abaixo apresenta algumas das atitudes esperadas de um bom torcedor. Qual das alternativas abaixo não corresponde a uma atitude respeitosa:
a) Só pode acessar o estádio aqueles que adquiriram os ingressos de forma legal.
b) Na estrada do estádio o torcedor poderá negar-se a passar pela revista pessoal, tendo em vista que esse é um direito de todo cidadão.
c) Não é permitida a entrada de torcedor com objetos proibidos e nem mesmo fogos de artifício.
d) Cada torcida deve ocupar o seu espaço e respeitar também o espaço do outro.
SUGESTÃO DE VÍDEO:
https://www.youtube.com/watch?v=GpTOzBE_Ggc